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UM LUGAR SILENCIOSO

Por: Dino Lucas Galeazzi

Um Lugar Silencioso (A Quiet Place, EUA, 2018)
Direção: John Krasinski
Roteiro: Bryan Woods, Scott Beck e John Krasinski.
Elenco: Emily Blunt, John Krasinski, Noah Jupe, Millicent Simmonds, Cade Woodward, Evangelina Cavoli, Ezekiel Cavoli.
Duração: 90 minutos


No ano de 2020, a população mundial fora dizimada frente à invasão de uma raça alienígena de predadores cegos que atacam tudo aquilo que produz qualquer tipo de som. Após uma perda terrível, uma família composta por quatro membros muda-se para uma fazenda isolada, na esperança de sobreviverem sem fazer barulho, mas a gravidez de Evelyn (Emily Blunt), a mãe, e o iminente nascimento da criança irão pôr todos eles em perigo.


 “Um Lugar Silencioso” (A Quiet Place, 2018) arrancou elogios da crítica e chamou a atenção do público por diversos motivos, sendo o principal deles o trabalho primoroso feito para com o som, elemento que se destaca tanto pelo ponto de vista técnico, bem como pela sua utilização na narrativa. Afinal, o filme gira em torno disso: o anseio incessante da família pelo silêncio absoluto, interrompido por esporádicos – e assustadores – ruídos, converge, inexoravelmente, para o vagido contido no útero materno, uma bomba-relógio prestes a detonar.



Simples, linear, porém eficaz, eletrizante: este é “Um Lugar Silencioso”, o qual, assim como “Corra!” (Get Out, 2017) de Jordan Peele, é mais uma estréia no gênero de terror feita por um ator cômico, no caso John Krasinski, famoso pelo papel de Jim Halpert no remake homônimo americano da série “The Office” (idem, 2005-2013), que aqui ocupa o papel de diretor – e de roteirista – atrás das câmeras, e de protagonista diante das mesmas.


Apesar das restrições orçamentárias (apenas 17 milhões de dólares), Krasinski conseguiu se virar com um punhado de locações e com um poker de atores: a lacuna deixada pela exigüidade dos efeitos especiais fora preenchida por um uso excelente do suspense, aqui amparado pela edição e mixagem do áudio: uma vez que o silêncio é dominado pela tensão, qualquer ruído gera desconforto ou até terror no público, uma sacada já utilizada pelo diretor uruguaio Fede Alvarez em “O Homem das Trevas” (Don’t Breathe, 2016) alguns anos atrás.



Em um dos saudosos vídeos-ensaios do canal de YouTube canadense Every Frame a Painting, o editor e videomaker Tony Zhou falara da importância do silêncio nos filmes de Martin Scorsese: como relatado pelo ítalo-americano em pessoa em uma entrevista, após os sucessos de “Taxi Driver – Motorista de Táxi” (Taxi Driver, 1976) e “New York, New York” (idem, 1977), ele e o editor de som Frank Warner, percebendo o excesso de efeitos sonoros em “Touro Indomável” (Raging Bull, 1980), optaram por remover inteiros trechos de trilha sonora para deixar, em seu lugar, o silêncio. O resultado é um conjunto de cenas icônicas, sendo a principal aquela em que Jake LaMotta, o boxeador protagonista, decide não reagir aos golpes de Sugar Ray Robinson: pouco antes da lendária saraivada de socos e esguichos de sangue, surge um silêncio quase religioso, que confere à seqüência uma atmosfera catártica, um segundo significado metafísico.


Certamente, o debute na direção de Krasinski não alcança o nível do último grande filme da New Hollywood*, mas aprecia-se o esforço de nadar contra a correnteza pela qual fluem os demais blockbusters de hoje, com faixas de áudio repletas de estrondos e gritarias.


Os jump scares em “Um Lugar Silencioso” não são ditados por um repentino aumento da trilha sonora ou por uma mudança abrupta de cena, pois nascem a partir de elementos diegéticos**, como o estalar dos passos no cascalho ou o grito que escapa pelos lábios cerrados, tornando o filme mais orgânico, realístico.


Todavia, não temos, aqui, um retorno às origens do cinema, pois o filme não é mudo, mas, sim, à essência da sétima arte, uma vez que o áudio é utilizado de forma minimalista, algo que não o entrega gratuitamente ao público, mas que o valoriza.


De fato, o filme brinca com um contraste interessante: por um lado, temos o pânico, associado ao choro, ao grito e às demais externalizações – barulhentas – de nossos anseios interiores; pelo outro, há o silêncio, o ato de calar-se enquanto repressão dos impulsos humanos e da verbalização dos mesmos.


Um dos dois filhos do casal protagonista é surdo, portanto os demais membros da família comunicam através da linguagem dos signos. Como o próprio diretor comentou numa entrevista concedida ao jornal Indiana Daily Student, o que podia se tornar óbvio, didático, através diálogos, está, ao invés, escondido nos gestos, que são reveladores do caráter dos personagens: é por isso que os signos feitos por Lee, o forte pater familias, são bruscos e curtos, enquanto os de Emily, mãe preocupada para com as crianças, são mais gesticulados e poéticos.


É em sutilezas como esta que encontramos os méritos de um filme.



Além do já citado Krasinski, o roteiro fora assinado também pela dupla Bryan Woods e Scott Beck, já parceiros em filmes de terror como “The Bride Wore Blood” (sem título no Brasil, 2006) e “Nightlight” (sem título no Brasil, 2015).


Entre os atores principais, temos, no papel de Evelyn, a esposa do diretor, Emily Blunt, já famosa por sua prestigiosa atuação em “Sicario: Terra de Ninguém” (Sicario, 2015), o jovem Noah Jupe, que se destacara no “Suburbicon: Bem-vindos ao Paraíso” (Suburbicon, 2017) de George Clooney, que vive Marcus Abbott, um dos filhos do casal, enquanto Millicent Simmonds, do “Sem Fôlego” (Wonderstruck, 2017) de Todd Haynes, é a caçula surda da família.


* Movimento cinematográfico da década de ’70 que renovara técnica e esteticamente a indústria cinematográfica estadunidense. Alguns dos principais expoentes deste movimento foram Martin Scorsese, Francis Ford Coppola, Brian De Palma, William Friedkin e Robert Altman, dentre outros. (wikipédia)


** Em Cinema e outras linguagens audiovisuais, diz-se que algo é diegético quando ocorre dentro da ação narrativa ficcional do próprio filme. (dicionarioinformal)



  

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https://www.cinehorror.com.br/mais-acessados/um-lugar-silencioso?id=606
| 1753 | 28/07/2020
O filme brinca com um contraste interessante: por um lado, temos o pânico, associado ao choro, ao grito e às demais externalizações – barulhentas – de nossos anseios interiores; pelo outro, há o silêncio, o ato de calar-se enquanto repressão dos impulsos humanos e da verbalização dos mesmos.
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