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OS MELHORES LONGA-METRAGENS DE HORROR DE 2018

Por: Saul Mendez Filho e Dino Lucas Galeazzi

Na humilde perspectiva de quem logicamente não assistiu tudo o que foi produzido no mundo dentro da categoria, e tentando equilibrar a subjetividade do gosto pessoal com a real qualidade técnica e de conteúdo iminente às obras.


 


Por Saul Mendez Filho


Posso dizer que assisti, entre curta-metragens, séries e animações, pelo menos seis filmes de horror e adjacências por mês durante o ano de 2018. Não considero nenhum desses filmes uma total perda de tempo e adoraria ressaltar a qualidade de alguns dos menos bem produzidos aqui. Sou um apaixonado pelo estilo Troma. Sou da escola antiga, quando vísceras importavam mais que vanguardismo ou discurso social. Mas estou focando nesta lista um nicho bem específico de filmes produzidos e/ou lançados no grande mercado e/ou principais festivais do circuito NORTE-AMERICANO, e subtraindo as produções nacionais - elas pertencem, afinal, a uma realidade que merece ser abordada à parte. Primeiro por se inserir no muito diferente universo da produção brasileira, e em âmbito maior no muito diferente universo da produção sul-americana e latina como um todo. Segundo, por possuir maior abrangência na área dos curta-metragens, visto as dificuldades e limitações na produção de longas. Inserir aqui um dos poucos longas nacionais do gênero que conseguiram ser realizados e ainda passaram pelo citado funil do circuito norte-americano em 2018 poderia soar como pieguice e puxa-saquismo. Não é o caso.


 


Dentro desses parâmetros, o principal motivo para que os filmes tenham entrado na lista e nessa ordem, é porque eu quis. Não existe, infelizmente, outra defesa.


Vamos aos finalistas, em uma lista de 8, com citações transversais.


 


PRIMEIRO LUGAR:


Hereditário (Hereditary, dir.: Ari Aster)


 


Hereditário possui ótimo ritmo, trabalha muito bem sua teia de simbolismos e é a melhor realização até hoje a se enquadrar na vanguarda cinematográfica representada para alguns pelo alardeado termo “pós-horror”. É, sem dúvidas, um filme que atinge todos os chakras dos fãs do gênero, indo do contexto referencial de Polanski e Friedkin a uma bem trabalhada estética do cinema independente formatada nas ultimas décadas pela jovem geração de Sundance. É arte e entretenimento facilmente deglutível e de qualidade fácil de reconhecer, tanto por artistas quanto pelo publico médio que está acostumado a um cinema além da ação popcorn, aqueles capazes de assistir aos indicados do Oscar e do Globo de Ouro sem reclamar de sono. É, acima de tudo, grande arte, com grandes atuações – e extremamente perturbador. Nenhum filme desta lista realmente assusta, exceto este vencedor, capaz de gerar angústia nos mais fracos ou inadvertidos.


 


SEGUNDO LUGAR:


Mandy (Mandy, dir.: Panos Cosmatos)


 


Se Hereditário é Renée Magritte, Mandy é Jackson Pollock. No terreno da vanguarda, este se inscreve com V maiúsculo, em um espetáculo que rumina e regurgita um remix de cultura headbanger e neohippie nos tons de Mad Max e Hellraiser, com momentos nonsense e ambientação onírica (dopada) que se tornam magicamente inesquecíveis. É o horror mais WTF dos ultimos anos. Um maravilhoso WTF bem grande, estampado num outdoor.


 


TERCEIRO LUGAR:


A Noite Devorou o Mundo (La Nuit a Dévoré Le Monde, dir.: Dominique Rocher)




O que seria mais um entre as milhares de apostas entre os filmes de apocalipse zumbi é, na verdade, um espetáculo do vazio e do isolamento. Um filme que acontece mais no que não se vê, uma sobrevivência travada em ambiente fechado, em monólogos mentais que não se escutam e em um roteiro muito bem elaborado sobre a necessidade de libertação do confinamento – seja ele uma barreira física ou psicológica. É um horror tão intimista quanto o mais intimista dos dramas. E não deixa de surpreender quanto a maquiagem e efeitos, nos raros momentos em que a ação física se desenvolve. Estaria facilmente em segundo lugar, se Panos Cosmatos não tivesse dopado meu cérebro com tanta eficácia.


 


QUARTO LUGAR:


Puro-Sangue (Thoroughbreds, Dir.: Cory Finley)




Aqui é onde eu dou aquela velha roubadinha, o “jeitinho brasileiro”. “Puro-Sangue” é uma trama de suspense que circulou pelos festivais ao longo de 2017, mas só foi lançado no mercado mundial em março de 2018. Muito se falou de “A Casa que Jack Construiu” (The House Jack Built) de Lars Von Trier, montado com os mesmos maneirismos de seu filme anterior em duas partes (Ninfomaníaca) e sua racionalização exacerbada ao abordar um psicopata como o personagem principal. Apesar da relevância e belíssima violência do filme de Trier, “Puro-sangue” passa desapercebido como uma beldade oculta no canto da sala, retratando com muita habilidade a psicopatia em um filme que fala menos, mostra menos e ganha em quase todos os aspectos. Cory Finley controla a trama com a maestria esnobe de um Hitchcock que refilmasse “Almas Gêmeas” (Heavenly Creatures, Dir.: Peter Jackson). As jovens atrizes Olivia Cooke e Anya Taylor-Joy embelezam e abrilhantam o filme com atuações que não devem nada a Matt Dillon nenhum.


 


QUINTO LUGAR


Um Lugar Silencioso (A Quiet Place, dir.: John Krasinski)




Nada como uma boa ideia e um roteiro redondinho. O melhor sci-fi de horror do ano é um filme excessivamente silencioso mas inteligente o bastante na arte de gerar tensão e expectativa frente àquilo que já sabemos que irá acontecer. É tudo muito previsível e, ainda assim, funciona muito bem. Krasinski segue uma cartilha eficaz, e acerta o alvo no coração sem muitos riscos além da possível monotonia silenciosa. Emily Blunt se mostra merecedora de mais papéis no gênero horror.


 


SEXTO LUGAR


Os Estranhos: Caçada Noturna (The Strangers: Prey at Night; Dir.: Johannes Roberts)




Se a premissa é assistir um filme de horror divertido, violento, com os trilhos bem definidos nos moldes slasher e com bastante ação, a breguice do segundo filme de Bryan Bertino (que desafia toda lógica ao seguir um caminho completamente diferente do anterior) é uma surpresa tão risível quanto agradável. Para além do cinema de horror “cabeça”, o que temos aqui é um filme genérico de terror tecnicamente bem feito e direto ao ponto pra se tornar a futura escolha de Netflix na noite de Halloween. Em outros tempos facilmente entraria na lista eterna de reprises do Cinema em Casa no SBT. Apesar das referências, ao mesmo tempo o filme não parece nada deslocado de seu ano de lançamento, o que não acontece com “Verdade ou Desafio” (Truth or Dare, Dir.: Jeff Wadlow) outro entretenimento retrô lançado neste ano que, por sua vez parece datado, recém saído de uma coleção de slashers teen no pós-Pânico dos anos 90.


 


SÉTIMO LUGAR


Await Further Instructions (Dir.: Johnny Kevorkian)



Se o número sete deve ser guardado para algo especial, este vai para um filme de nomes pouco conhecidos. Com uma premissa que cria tensões e discursos sobre família e política durante a primeira metade (o que agrada a maior parte do público atual), tudo cai por terra (ou não) em uma segunda metade que finca os pés no cinema fantástico e apresenta os dez melhores minutos finais no que tange a relembrar os bons tempos de Sitges e Avoriaz. Os efeitos práticos extremamente eficientes recriam estéticas de Clive Barker e H. R. Giger em meio ao stop-motion de um Jan Svankmajer, relembrando até o clássico Tetsuo de Shinya Tsukamoto. Em tempos de conflitos acirrados de opinião, quem assiste a este filme tende a gostar de uma metade ou de outra: escolha a sua.


 


OITAVO LUGAR


Searching (Dir.: Aneesh Chaganty) e Unfriended: Dark Web (Dir.: Stephen Susco)




O oitavo lugar precisa ser compartilhado por dois filmes que representam, conjuntamente, o subgênero “desktop film”, que merece a devida atenção deste ano em diante. Searching é, primeiramente, o suspense mais eficiente do ano e o segundo filme da franquia Unfriended não fica pra trás. É necessário um trabalho FODA (para não utilizar nenhum termo mais fraco) de roteiro pra desenvolver um filme que se passa 100% na tela de um computador. Nesse aspecto, Aneesh Chaganty e Stephen Susco conseguem mostrar que de fato é possível fazer filmes assustadoramente eficientes nesse novo gênero, que é bem semelhante (e ao mesmo temo extremamente diferente) ao found footage. Ambos os filmes precisam ser vistos para entender por completo estas afirmativas: tentar modular no papel o estudo do roteiro destes filmes é um desafio que deve ser apresentado para os estudantes de cinema em geral. O resultado se assemelhará, provavelmente, a um fluxograma - tudo, menos os moldes clássicos dos “first drafts” da vida. É como programar BANDERSNATCH. Existem chaves e portas…




 


 


 


Por Dino Galeazzi


9 - LIVERLEAF



O que começa como um drama contundente sobre a alienação da vida escolar japonesa e a incomunicabilidade entre gerações, torna-se, repentinamente, uma trágica história de vingança. A epopéia sangrenta iniciada pela bela Haruka Nozaki nos remete a clássicos nipônicos como “Lady Snowblood: Vingança na Neve” (1973) e sua seqüência, “Lady Snowblood 2: Love Song of Vengeance” (1974), ambos elogiados pelo enfant terrible Quentin Tarantino. Além da similaridade temática, o que “Liverleaf” (2018) compartilha com as obras de Toshiya Fujita é a ambientação nevosa: os característicos gêisers de sangue traçam desenhos na neve, como tinta escarlate esguichada por sobre uma tela branca. O que o filme perde em uma duração excessiva e em algumas reviravoltas previsíveis, certamente é compensado pela excelente direção de Eisuke Naitô e por um final extremamente niilista. 


 


8 - ANNIHILATION



Todos lembram de Alex Garland enquanto diretor do tão elogiado “Ex Machina” (2014). Todavia, ao assistirmos seu último trabalho, talvez seja mais interessante buscarmos paralelos com um de seus melhores roteiros, o que deu origem ao filme “Sunshine – Alterta Solar” (2007), dirigido por Danny Boyle. De fato, também neste último acompanhamos um grupo de personagens que embarca na mesma expedição suicida de uma primeira equipe, a qual fracassou em seu objetivo. Tanto em “Aniquilação” (2018) como no roteiro de 2007, o resultado destes insucessos transfigura-se em horror corporal: no primeiro caso, um meteoro cria uma área de instabilidade ao seu redor, onde as leis da física e da genética são postas em crise, engendrando mutações bizarras; no segundo, uma criatura monstruosa, resultado das radiações solares, persegue os membros da mais nova equipe.


Mesmo defeituoso, o último trabalho de Garland vale a visão por fundir Sci-Fi e Body Horror, algo que nos remete aos clássicos da década de 1980.


 


7 - HALLOWEEN



Para alguns, apenas uma operação de fun service. Para outros, melhor que o original de 1978. Para poucos, uma grata surpresa.


Diferente dos demais reboots que têm assolado Hollywood nos últimos tempos, o “Halloween” (2018) de David Gordon Green faz o que quase todos os recentes relançamentos das grandes sagas têm esquecido de pôr em prática: inovar, mas sem deixar de lado o legado da matéria original.


Enquanto os mais novos capítulos de Star Wars tentam encobrir as similaridades alarmantes para com os primeiros capítulos da saga assinados por George Lucas, o novo “Halloween” (2018), ao mesmo tempo em que se afasta do original ao nos propor uma nova mise-en-scène e um renovado tratamento do suspense, não deixa de lançar mão da forte herança iconográfica do clássico de John Carpenter. 


 


6 - THE DARK



Obra-primeira do diretor Justin P. Lange, “The Dark” (2018) é um “A Bela e a Fera” pelo avesso, em que a fera é substituída por uma menina-zumbi que voltou do reino dos mortos para devorar quem se aventura pela floresta de Devil’s Den, enquanto a bela é vivida, agora, por um adolescente que sofre da síndrome de Estocolmo. A relação sentimental desse improvável casal só é possível uma vez que o jovem teve seus olhos queimados pelo próprio seqüestrador, o que lhe impede de se sentir horrorizado diante da putrefação avançada do corpo da menina.


Apesar do contexto fantasioso da obra, o diretor optou por uma abordagem realista, recusando o auxílio de uma trilha sonora e reduzindo tanto os diálogos como a ação ao mínimo essencial. Mais uma vez nos é dada confirmação da eficácia do gênero do horror para tratar de temáticas fortes: no caso específico, o abuso infantil.


 


5 - THE HOUSE THAT JACK BUILT



O filme-testamento de Lars von Trier é um mergulho na mente de um serial killer: escoltado por Virgílio em pessoa, Jack, o nosso anti-herói, interrompe o silêncio da viagem às profundezas do Inferno para relembrar cinco momentos que marcaram sua existência de assassino psicopata. O público, portanto, não é poupado de inúmeras atrocidades: desde a mutilação de um pato até a experimentação cirúrgica feita no cadáver congelado de uma criança, tudo nos é mostrado nos mínimos detalhes.


Todavia, longe de ser um mero espetáculo de violência gratuita, “A casa que Jack construiu” (2018) é a confissão última da ex-persona non grata do Festival de Cannes, um autorretrato de um artista que, preocupado em resgatar a essência da sétima arte, devotou sua obra aos horrores cometidos pelo ser humano. Apesar dos sofríveis momentos de egotrip do diretor, da repetição das mesmas soluções estético-narrativas já apresentadas em “Ninfomaníaca: Volume 1” (2013) e em “Ninfomaníaca: Volume 2” (2013) e da duração excessiva, o último filme de Lars von Trier não deixa de ser um dos melhores filmes de horror do ano.


 


 


4 - CAM



A pior forma de se descrever o longa-metragem de estréia de Daniel Goldhaber é definindo-o como sendo um episodio da série “Black Mirror” (2011 – ) mais longo que o normal. O fato da protagonista, Alice, recorrer à única coisa que lhe resta, isto é, seu corpo, para fugir deste pesadelo tecno-surrealista que é a realidade contemporânea, desvela, in vero, a matriz cronenberguiana de “Cam” (2018). A fronteira entre realidade off-line e ficção on-line, quase sempre muito bem demarcada nos episódios da série de Charlie Brooker, encontra, aqui, seu ponto de colapso, haja vista do desafio final, envolvendo uma miríade de reflexos num bizarro jogo de espelhos e telas, ou do momento em que Alice, atônita diante do próprio notebook, acredita que seu clone virtual está dentro de sua casa, o que a leva a bater contra a porta do seu quarto, num gesto de desespero.


Por enquanto, “Cam” (2018) é a melhor produção assinada pela Netflix.


 


3 - HEREDITARY



Como já o próprio título deixa claro, “Hereditário” (2018) trata da maldade atávica ínsita no DNA de uma família, daqueles laços de sangue que, diferente dos demais, não podem ser desfeitos. Apesar do diretor Ari Aster recusar esta classificação, seu primeiro longa-metragem é um filme de horror clássico que bebe das fontes sagradas do gênero: “O Bebê de Rosemary” (1968) de Roman Polanski, “Inverno de Sangue em Veneza” (1973) de Nicolas Roeg e “Os Inocentes” (1961) de Jack Clayton, ao lado dos filmes de terror nipônico como “Onibaba – A Mulher Demônio” (1964) de Kaneto Shindô, serviram como norte para a arte terrífica da obra.


Talvez, o maior mérito do filme é o fato do próprio se sustentar sozinho enquanto drama familiar, sem a necessidade do elemento fantástico: antes que o artifício do suspense e a atmosfera horrorífica, o que gera maior incômodo no espectador é a dinâmica entre os Graham, isto é, a disfuncionalidade desta família, algo posto em cena com um realismo cruel, sobretudo durante o primeiro ato. 


“Hereditário” (2018) é mais um acerto da A24, a produtora mais interessante do recente cenário cinematográfico hollywoodiano.


 


2 - UPGRADE



Máquinas e humanos estão tão imbricados no mais recente filme de Leigh Whannell que não podemos mais diferenciar um do outro... se é que ainda podemos falar em alguma diferença entre os dois.


“Upgrade” (2018) não é simplesmente o filme com as mais belas cenas de ação dos últimos anos, pois nas mesmas podemos detectar uma camada de significados mais profunda: quando nosso herói, Grey Trace, cede às rédeas de seu corpo à inteligência artificial denominada STEM, a câmera deixa de ser operada por humanos, passando a mover-se segundo parâmetros computacionais. Ou seja, se ainda nos resta alguma dúvida sobre o resultado do embate homem/ máquina, Whannell nos mostra quanto do cinema já de converteu em indústria.


 


1 - MANDY



Alucinógeno. Visceral. Violento.


Panos Cosmatos, filho do obscuro e desconhecido diretor George P. Cosmatos, demonstra, já com seu segundo trabalho, de possuir a rara capacidade de criar mundos cinematográficos que funcionam segundo uma lógica própria, como ocorre na filmografia de um David Lynch ou de um Luis Buñuel.


Meio termo entre o filme grindhouse da década de ’80 e o cinema arthouse pós-moderno, “Mandy” (2018) é mais que um simples revenge movie protagonizado por Nicolas Cage: a densidade de símbolos é tamanha que convida o espectador a ulteriores revisões da obra.


Louvável, inclusive, o esforço por parte do diretor e da sua equipe de resgatar a textura das antigas películas cinematográficas. De fato, há momentos em que é possível sentir o grão do filme, sua porosidade, como nas seqüências em que aparecem os motoqueiros, constantemente envoltos por uma neblina banhada por luz violeta. Não se trata, aqui, de simples fetichismo nostálgico, pois o efeito contribui para aumentar o sentido alucinatório da obra.


“Mandy” (2018) é uma lenta jornada para o inferno sob o efeito do LSD.


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| 1690 | 14/01/2019
Apresentamos uma lista dos melhores do ano, feita por dois de nossos críticos. Lembrando que as opiniões aqui são puramente pessoais!
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