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SUSPIRIA - Especial 40 anos

 
Especial 40 anos de Suspiria
Sexta feira, 19hs, 13 de Outubro / 2017
Sala de Cinema Walter da Silveira 
Salvador – BA

A campanha publicitária de Suspiria (1977) do diretor italiano Dario Argento alertava: “a única coisa mais aterrorizante do que os 12 últimos minutos desse filme são os 92 primeiros”. É exatamente durante esses doze últimos minutos em que a atriz Jessica Harper, no papel da bailarina Suzy Bannion, atravessa a porta secreta da Tanz Akademie alemã e encontra a bruxa grega Helena Markos, a Rainha Negra. Não se trata de um spoiler: a magia dessa obra é a magia cinematográfica, que engloba todos os segundos desde o primeiro rufar de tambor dos créditos iniciais até o derradeiro acorde dos créditos finais.


O filme abre a trilogia das “três mães” de Argento, baseada no Suspiria de Profundis de Thomas de Quincey – obra literária de 1845 cunhada como “fantasia psicológica” e inspirada nas alucinações à base de ópio do autor inglês. O conciliábulo de bruxas planejado por Argento está diretamente atrelado com a arquitetura, visto que cada “mater” (mãe) está ligada a uma construção: em “A Mansão do Inferno” (Inferno, 1980), revela-se esse pano de fundo que em Suspiria se mantém em águas rasas (é plena de sentido a cena de mergulho nessa segunda obra da trilogia). Em Suspiria, por sua vez, a imersão é plenamente sensorial; a história vai acontecendo nos intervalos em que o principal ator – o som – se distancia, embora pulsante e prestes a tomar seu lugar de destaque. Ele é o primeiro a surgir, com imponência, e o último a nos abandonar, com seus acordes ressoando em sonhos.


A premissa é simples, e narrada em off pelo próprio diretor durante os créditos iniciais: “Suzy Bannion decide aperfeiçoar seus estudos em Ballet na mais famosa escola de dança na Europa. Ela escolheu a celebrada academia de Friburgo. Certo dia, às 9h da manhã ela saiu do aeroporto Kennedy, Nova York, para desembarcar na Alemanha às 10h da noite, hora local”. Ao chegar debaixo de uma tempestade, pede por um táxi, mas nenhum para. Ao menos, nenhum dos táxis brancos para – apenas um taxi preto. Ao chegar na porta da Tanz Akademie, uma aluna abre em fuga, grita algumas palavras inaudíveis para alguém dentro do prédio e passa por Suzy, correndo desesperada tempestade adentro e através da floresta. Não é errado por parte do espectador imaginar que, em algum momento, a aluna que chega se tornará, também, uma aluna que parte sob circunstâncias similares. Reside um déjà-vu neste momento-chave do filme. Hospedada na escola com as colegas e a equipe a mando de Madame Blanc (Joan Bennett), muitos horrores ocultos estão por ser descobertos, e tudo deve ser observado com os ouvidos(!) atentos.

 


É inevitável perceber como Argento quer tornar o intangível presente em Suspiria. Visualmente, sombras e estranhos reflexos de luz espreitam o espectador mais atento. Ainda que não seja diretamente percebida, a fantasmagoria ganha acesso ao subconsciente do espectador, imerso na projeção em uma sala escura, no repetitivo teclado ritualístico a soar e nos sussurros de melodia em estranhos guturais. Em alguns momentos, Argento enquadra a cena através de uma grande angular que levemente deforma a imagem nas bordas enquanto comprime o cenário em detalhes. O pesadelo transcorre sob gelatinas azuis, verdes e no vermelho do sangue que permeia o filme: um tom quase neon, que escorre em pinceladas de Pollock. É em meio a isso que Argento treina sua composição de imagem, seus movimentos de câmera, seu jogo de planos, luzes e simetrias através de espelhos, reflexos e geometria do cenário, com um extremo controle entre suas intenções e o resultado final. Suas marcas registradas estão aqui: mulheres estilhaçam os vidros com seus rostos e se contorcem de medo perante o fio de uma navalha. É necessário citar a importância de Daria Nicolodi e Giuseppe Bassan, que em uma eterna parceria com o diretor conseguiram cooperar para uma criação tão primorosa, abraçando diversas estéticas das artes visuais e criando apenas uma – múltipla em suas referências e encerrada no universo único da obra.

 


 

Assim que dá o primeiro passo fora do aeroporto na primeira cena, Suzy Bannion se vê rodeada de sonho: uma realidade fantástica, repleta de cores e geometrias. O espectador é mais um viajante a adentrar essa fantasia. Suspiria é uma viagem que merece ser apreciada mais pelo caminho do que pelo destino: o traço entre realidade e sonho é extremamente sutil e pautado na estética. O vento possui uma fisicalidade grandiosa, sempre sobre os cabelos e agindo nas janelas, com seu característico assovio se sobressaindo à realidade mundana para provar, mais do que nunca, a presença do invisível.


A importância do som para a obra compactua com isso: um dos elementos mais necessários para Suzy Bannion é a capacidade de escutar, sejam as palavras fragmentadas em som baixo de uma moça que foge em uma noite chuvosa, seja um ronco específico com um sibilar agudo do outro lado de uma cortina, sejam os passos nos corredores a serem contados um a um. Em seu aniversário de 40 anos, cabe considerar Suspiria como uma obra a ser, principalmente, escutada – e não só pela bela trilha resultante do trabalho conjunto entre a banda Goblin de Claudio Simonetti e Dario Argento. Em um momento memorável do filme, o pianista Daniel (Flavio Bucci) abandona a Tanz Akademie furioso e aos gritos, afirmando: “Eu sou cego, mas não sou surdo. Entendeu? Não sou surdo!”. Essa é a mensagem. Não sejam surdos à obra, e chegarão, em passos contados, à porta secreta da íris azul, ao encontro da Mater Suspiriorum.

Saul Mendez para o Gore Bahia, 28/07/2017

#CineHorror @Suspiria #Suspiria #DarioArgento
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