Autores: José Muñoz e Carlos Sampayo.
Editora: Pipoca e Nanquim.
Páginas: 420.
É incrível como muitas vezes algo tão próximo pode demorar tanto para aparecer em nossas vidas. A Argentina é um país que divide fronteira com o Brasil e possui, em certo grau, uma história similar a nossa. Ambos sofreram com ditaduras militares e passam por um momento de reestruturação política e econômica, porém, nossos “hermanos” possuem um legado na nona arte que se equipara à nossa tropicália. Nomes como Oesterheld, Breccia (pai e filho) e Trillo serão lembrados eternamente por mim como alguns dos meus artistas favoritos e mentores no quesito de quadrinhos sul americanos. E agora, José Muñoz e Carlos Sampayo entraram nesse panteão com Alack Sinner.
Em uma Nova York suja e violenta, acompanhamos nosso protagonista: Alack Sinner, um detetive particular que já foi policial, mas que perdeu toda sua fé na instituição a qual serviu e como seu nome representa muito bem, mais um pecador sobrevivendo ao inferno cinza que é sua cidade. Alack lembra bastante Corto Maltese. Ambos possuem uma grande resistência às autoridades e são mais propícios a ajudarem os mais necessitados sem se importar tanto com a moralidade de um ato de gentileza, para eles é mais como um instinto. Andar com Alack é como entrar em um inferninho repleto de fumaça de cigarro e ter seus passos acompanhados por Miles Davis e John Coltrane.
Nas três primeiras histórias vemos uma dupla contida, Muñoz e Sampayo entregam histórias noirs clichês mas bem competentes. Mas, a partir de Viet Blues a dupla mostra sua genialidade. Alack se torna um manifesto contra as mentiras do American Way of Life e expõe diversas injustiças aceitas por uma sociedade extremamente problemática. Desde veteranos viciados em heroína a agentes americanos destruindo vidas em prol da nação.
A vizinhança de Alack é composta majoritariamente por imigrantes, por isso nosso protagonista caminha por ruas abandonadas pelo governo local e entra em contato com histórias que o americano médio nunca vivenciou. Seu ciclo social é composto por pessoas que já cruzaram a linha da lei diversas vezes e que não são julgadas por Alack. Mostrando que o personagem possui valores que destoam do status quo de sua época e o aproximam de massas carentes por um mínimo cuidado. Tudo isso registrado pelo traço peculiar de Muñoz, que exalta as expressões e movimentos das personagens de uma maneira que fica entre um sonho febril e uma realidade dura como concreto.
Alack Sinner é realmente uma das maiores obras da história, uma narrativa que quebra as fronteiras entre quadrinhos e literatura. Principalmente na sua segunda metade, onde nosso protagonista revisita memórias reprimidas, enfrenta sua solidão e encontra a si mesmo longe da violência que estava acostumado. É uma obra que deveria estar em todas as estantes de quem gosta de ler e até mesmo em bibliotecas públicas, pois dialoga diretamente com vários problemas que infelizmente persistem até hoje. A edição da editora Pipoca e Nanquim vêm com um acabamento de luxo, textos de apoio para compreender melhor o contexto da obra e de seus autores, e pode ser adquirida tanto na Amazon quanto no site da editora.
Onde comprar:
O que você faria se um aplicativo te mostrasse quanto tempo você tem antes de morrer? É isso que acontece com a jovem Quinn, personagem de Elizabeth Lail (\"You\") no longa \"A Hora da Sua Morte\".