THE HOUSE GUEST (Itália/2020).
Direção: Domiziano Cristopharo.
Elenco: Daniele Arturi, Domiziano Cristopharo.
Sinopse: Filmado durante a quarentena, "The House Guest" tem como tema a reapresentação da "casa amaldiçoada", tema central do cinema de terror, local precioso que não tem tempo e lugar definidos ou classificáveis dada a multiplicidade de títulos (inclusive pedras angulares do gênero) voltados para as casas mal-assombradas ou para a casa pintada como um lugar onde o terror se esconde.
Uma coisa que o ano de 2020 demandou dos realizadores foi criatividade. Sob diversas restrições de mobilidade e contato, foi necessário buscar alternativas para narrar histórias confinadas em espaços de isolamento. Enquanto algumas produções partiram para soluções tecnológicas que rapidamente vem à mente, como filmar no formato desktop movie, outros optaram por expandir o máximo possível os limites do que se consegue entre quatro paredes.
É o caso de "The House Guest", de Domiziano Christopharo, que aproveita a trama de um novo inquilino em um lugar amaldiçoado para tecer uma história amarrada por cenas gore com muitos efeitos práticos. Na impossibilidade de muita ação entre personagens, o foco de Christopharo parte para o horror corpóreo real e imaginado, criando uma relação entre a estrutura da narrativa e o desnorteamento de um personagem que perde a noção do tempo e não reconhece mais o que é fato e o que é sonho. Como fio condutor temos a história do “Bispo das Areias” que se desvenda pouco a pouco como o motivo por trás da maldição. A loucura irá acometer qualquer inquilino que ocupar o apartamento. A trama toda é muito simples, e o resultado muito eficiente.
"The House Guest" se assemelha bastante à estrutura de alguns filmes de Lucio Fulci e é claramente um roteiro formado em torno desses momentos onde os efeitos ganham o palco, em representações gráficas angustiantes de todo tipo de ferimento mortal, incrivelmente bem realizadas com um orçamento limitado. O gore é hoje um elemento infelizmente relegado apenas a produções independentes, visto que o horror da grande indústria passa por uma fase focada em horrores sociais e sutilezas imagéticas. Alguns chegam a falar da pouca relevância do gore como efeito no cinema de horror, já que a construção do medo não necessita daquilo que se vê mais do que daquilo que não se vê - ou aquilo que se diz. É, no fundo, uma discussão sobre a significância do gênero na cultura cinematográfica e se observa uma vontade muito grande de categorizar o horror como um “cinema inteligente”.
No entanto, a inteligência no fazer cinematográfico, na linguagem, não se limita de forma alguma apenas à mensagem social, à arte da mise-en-scène e composição fotográfica tão caras aos diversos filhotes de Inverno em Veneza (1973) que se encontram hoje nos streamings e ganhando as críticas pela internet. É dentro desse contexto que George Romero, apesar de laureado pela relação de seus filmes com uma crítica social simbólica, nunca deixou de expor - de forma muito criativa - tripas e miolos ou de inserir mutilações em seus roteiros. Parte do público hoje gosta de citar a crítica social presente em Dawn of Dead (1978) com ares de desculpa: o velho “apesar de”. “Apesar de gore, traz à tona uma discussão”.
É preciso, mais do que nunca, ressaltar que o gore é uma arte criativa e inteligente por si só. E "The House Guest", como obra realizada em meio a uma pandemia que acometeu especialmente de forma terrível seu país de origem - a Itália - é um dos bons exemplos disso no cinema independente atual.
"The House Guest" está disponível gratuitamente no quinto festival Cine Horror - edição online - até 20/12. Esse e outros filmes na programação podem ser acessados em www.cinebrac.com.br .
Trailer:
